27 maio 2011

Brasil: relaxa e goza.

Toda vez que ouço o nome de nosso país me lembro do Henfil. Não por causa da rima Brasil-Henfil, mas pelo que ouvi ele dizer em um entrevista na tevê, na década de 1980: 'o Brasil é um desastre'. É verdade, pois a grande maioria dos problemas brasileiros têm suas causas anunciadas muito tempo antes de acontecerem, porém o "fatalismo desastroso" é o que permanece sempre. Eu poderia citar o exemplo de políticos notoriamente corruptos que se elegem continuadamente.
Talvez o leitor pense que vou dizer que o brasileiro almeja a corrupção, deseja privilégios e obter vantagens a qualquer custo pouco se importando com a ética. Que a corrupção assola todos os setores da vida nacional inclusive nos três poderes da república, mesmo nas esferas mais altas. Que na polícia e na política há corrupção, que a maioria dos empresários são corruptos, que a maioria dos sindicatos são corruptos, que as ongs são em sua maioria corruptas. Que nas cortes mais altas há magistrados corruptos. Mas não vou dizer nada disso porque sou pobre e nunca cometi crime algum o que me torna um forte candidato a ir para a cadeia.
E quase fui preso. Recebi uma intimação da delegacia de Caxias do Sul para 'prestar esclarecimentos', porque a Delegacia de Crimes Digitais de São Paulo havia mandado uma carta precatória para que eu fosse ouvido sobre um suposto crime cibernético. O que se imagina quando digo isso é que o tal crime seja aplicar golpe em alguma conta bancária, roubando senhas por meio de programas fraudulentos que se instalam nos computadores das vítimas. Nada disso. Tudo por causa da frase que ficou eternizada na voz de Marta Suplicy: RELAXA E GOZA.
No começo do ano de 2010, o site Terra noticiou que uma juíza federal, de São Paulo, havia dado habeas corpus a uns pobres banqueiros e empresários envolvidos em falcatruas. Pois bem, a coisa não para por aí, o advogado dos empresários e banqueiros e que entrou com o pedido de habeas corpus e que me acusou de difamar a juíza é quem? Surpresa! O MARIDO DA JUÍZA. Não é brincadeira. Talvez ela até despachasse do quarto do casal para dar mais celeridade aos processos judiciais.
Só por este motivo ela devia ter-se dado como impedida para julgar os pedidos de habeas corpus, mas não: aceitou os casos e deferiu todos pedidos de habeas corpus feitos pelo maridão. Coincidentemente todos os pedidos do maridão caíam sempre com a esposa juíza e ela os deferia. O maridão, advogado competente, ficou rico, mas isso é detalhe que não vem ao caso.
Abaixo da notícia, no Terra, há um espaço para comentários. Alguém, que não eu, deve ter tecido comentário sobre a honestidade da juíza e manifestado indignação pela situação do Brasil dos escândalos. Logo abaixo do comentário dessa pessoa, outra pessoa escreveu a frase criminosa: RELAXA E GOZA. Esta frase nem era dirigida à magistrada e nem ao marido advogado competente, mas ao comentarista indignado.
Veio a carta precatória que me acusava de ter pedido a alguém para relaxar e gozar. Perguntei-me: Marta Suplicy pode, outra pessoa não? Agora vem o pior: eu nunca havia lido aquela notícia e nem postado aquele comentário. Jamais soube da existência da magistrada e nem que era casada com causídico tão importante. Na delegacia me informaram que o advogado havia conseguido que outro juiz, talvez amigo do casal, autorizasse a quebra do sigilo dos IP de todos que fizeram comentários no Terra e ali estava meu IP e meu nome, porém o e-mail não era meu, era totalmente estranho.
Pessoas que trabalham na delegacia estavam indignadas com tanta perda de tempo. Alguém comentou que a polícia tem muita dificuldade para conseguir quebrar sigilo telefônico ou de internet de traficantes, assaltantes, ladrões de banco, pois os juízes são muito criteriosos, mas neste caso algum juiz julgou oportuno quebrar o sigilo de IP de todos os comentaristas indignados com o casal, ou dupla.
Ainda não entendi porque o advogado-marido-de-juíza ficou tão indignado e acusou os comentaristas de difamar a juíza, se aquilo era uma notícia publicada no site Terra e jornais da época, eu soube depois. Se é notícia, é pública. Acho que esse advogado nem é tão bom assim, porque se alguém difamou a esposa dele foi toda a imprensa, ele devia ter ingressado na justiça contra os jornais, tevês e sites de informação que deram a notícia. Quem fez comentários não criou ou inventou os fatos, pensando bem ele devia ter entrado na justiça contra si e contra a esposa, pois foram eles que criaram esses fatos.
Até hoje não sei porque meu nome e meu suposto IP, naquele dia, foram envolvidos nisso, pois o e-mail nem era meu e nem de pessoa que eu conheça.
Disseram-me que poderia entrar na justiça para interpelar o site Terra. Daí lembrei de uma causa que ganhei contra o Banco Central e desde 1995 se arrasta na justiça federal, devido aos vários recursos que o banco interpõe para que eu não receba o que me deve. Pensei, melhor não me meter com essa tal de justiça, no Brasil.
Está difícil relaxar e gozar sendo brasileiro, até mesmo com overdose de viagra.

28/05/2011

23 maio 2011

O que veio antes: a

música ou a literatura? Acho que é a música. Imagino aqueles australopitecos reunidos em bando, há pouco mais de dois milhões de anos, daí mamãe autralopiteca não vê por perto o Júnior, um australopitecozinho de pouco menos de cinco anos, ela grita: Juuuuuniiiinhooooo. O grito ecoa e o som volta e confunde a mente da australopitecada toda que estava reunida em torno dos gravetos que virariam fogo à noite, numa região central da Grande Mãe África, supondo que os australopitecos dominavam o fogo.
Um daqueles machos gozadores, o palhaço do grupo, imita a voz feminina e todos caem na risada. Daí todos imitam a voz que chama 'Juninho' e as vozes vão formando acordes, os compassos vão se seguindo. No outro dia o australopiteco gozador lembra-se do eco e novamente entoa Juuuuuniiiiinhooooo, todos o imitam. Esta foi a primeira canção.
Mas havia um outro grupo de australopitecos, na Etiópia, que eram dados a observar pássaros e lhes imitar o canto, o que resultou uma música mais melodiosa. Estes primitivos humanóides tiveram a ideia de fazer instrumentos, como apitos, flautins e rabecas, para imitar a voz dos pássaros e atrair os bichinhos para as arapucas. Neste grupamento de hominídeos surgiu a primeira orquestra e a música instrumental.
Bem, a escrita veio bem depois, depois até das pinturas rupestres. Não sei ao certo, mas acho que de duzentos mil anos para menos, já a música deve ter uns dois milhões de anos.
Logo após a pintura veio a escrita. As pinturas rupestres podem ser consideradas como sendo prenúncio da escrita, pois mostram cenas cotidianas daqueles seres humanos que nos antecederam. Ficou constatado que as pinturas funcionavam como um quadro de avisos: as mulheres, por falta de alfabeto e gramática, faziam desenhos nas pedras para ilustrar as tarefas a serem cumpridas pelos homens diariamente. As mulheres mais velhas orientavam as mais novas a compor os desenhos como se fosse um organograma de trabalho para os homens. Nesses desenhos vê-se homens caçando, pescando, pastoreando, recolhendo lenha. Remonta essa época a má fama das mães das mulheres que ensinavam as filhas a serem megeras dominadoras.
Esqueci de dizer o que aconteceu ao Juninho. Naquele mesmo fim de tarde, a mamãe australopiteca e alguns machos, saíram à procura do guri australopiteco. Seguiram-lhe as pegadas. Deram de cara com um pisoteio desvairado na areia seca da savana africana, num capão de mato, não muito longe, um leopardo janta o último naco do lombo do infante australopiteco Juninho. Mamãe autralopiteca se desespera e põe-se a gritar. O choro vem, ela diz 'meu Juninho', o grupo solidário à dor da mãe chora quase em uníssono. Canção triste. Talvez tenha sido esta a origem do Canto Gregoriano.
Mais triste do que esta história é eu tocando guitarra. Veja aqui www.youtube.com/watch?v=XEcfljJAM1I . Bossanovizei a canção de George Harrison, While My Guitar Gently Weeps.

23/05/2011

15 maio 2011

Ler...

Leio.
Reli recentemente O Tao da Física de Fritjof Capra que traça paralelo entre as idéias budistas e a Física Quântica, principalmente o Princípio da Incerteza de Heisenberg. Li este livro pela primeira vez quando tinha 23 anos e tive a honra de conhecer e frequentar a casa do professor Mário Schenberg, em 1977, ele me indicou o livro. Fui à casa dele convidá-lo a proferir uma palestra em Botucatu, num encontro estudantil sobre ciências da saúde, que na realidade era uma reação de intelectuais atingidos pelo AI-5 à ditadura militar, o que ele aceitou de pronto. Mário Schenberg foi afastado de seu cargo de professor de Física da USP, com a edição do Ato Institucional No. 5, pois era militante do Partido Comunista Brasileiro pelo qual se elegeu deputado federal constituinte em 1946. Mário foi considerado por Einstein como sendo o físico mais brilhante e a mente mais privilegiada de sua geração. Ele morava numa casa ampla no fim da Avenida Doutor Arnaldo, em São Paulo, repleta de obras de arte que ganhava de artistas plásticos, praticamente todas as paredes da casa eram tomadas por quadros, no teto de todas as salas havia muitos quadros pendurados, ele era também crítico de arte. Ele me disse que o conhecimento intuitivo é tão importante quanto o conhecimento científico, acreditava que um pajé era tão importante e eficiente no que fazia quanto um cientista, por isso indicou este livro que faz essa ponte entre ciência e intuição.
Reli também Universo Elegante do astrofísico Brian Greene, sobre a teoria das supercordas. Ele explica também que não há conflito entre a Teoria da Relatividade Geral de Einstein e a Mecânica Quântica, porque a primeira deve ser empregada para explicar "grandes coisas" e a segunda explica "pequenas coisas". Quem se interessa por Física, procure os livros de Greene e Capra, além dos livros de Stephen Hawking.
Meu livro de cabeceira é Aprendendo a Viver do filósofo romano Sêneca, que educou Nero e depois foi por este condenado à morte.
Atualmente estou lendo Ciência Contemplativa de B. Alan Walace, o sub-título já indica o conteúdo: Onde o Budismo e a Neurociência se Encontram. Fragmentos de um Discurso Amoroso de Roland Barthes, O Pensamento Selvagem de Claude Levi-Strauss e um único livro de ficção: As Irmãs Makioka de Jun'Ichiro Tanizaki. Leio um pouco de cada livro e depois o cérebro que dê jeito de separar e organizar as informações.
Na semana passada saí da caverna e fui ao lançamento de um livro de contos, num bar daqui de Caxias do Sul. O escritor se chama Uili Bergamin, ele é tão bom que tem até nome de escritor. Não estou acostumado a esse tipo de evento, mas fui. Ali estava o autor, gravata e colete, simpático e sorridente, distribuía abraços, beijos, e se postava ao lado das pessoas para fotos. Parecia bem comportado como um bancário. Comprei um livro Contos de Amores Vãos, ele autografou. Sábado resolvi ler o livro. Esperava algo como... , nem sei bem o quê, mas muito menos do que é realmente o livro. Acho que esperava algo melado, aí que o livro me pegou. O texto vai dando ligeiras agulhadas no leitor, que quando percebe está todo cheio de hematomas pelo corpo. Eu que escrevo distribuindo porradas, não tinha defesa para escrita tão aguda e ferina como a de Uili Bergamin. A sutileza da escrita de Uili me deixou perplexo, não só da escrita como dele próprio: todos aqueles sorrisos, cara de bonzinho, mas o que ele escreve corrói até o metal mais duro. Acho que a aparência dele era blefe. Pura malandragem refinada. Li o livro e imediatamente o reli, são apenas cento e poucas páginas, fiquei com aquela sensação da pessoa que é roubada sem sentir e ainda sorri ingenuamente ao ladrão que lhe diz 'tenha um bom dia'. Agora estou curioso para ler os outros livros dele. É um nome a ser guardado. Um jovem escritor a ser lido sem medo de se decepcionar.

15/05/2011

10 maio 2011

Escrever...

Para quê?
Para quem?
Caberiam outras perguntas.
Acho que quem escreve se faz essas duas perguntas e muitas outras.
As editoras sempre perguntam a que tipo de público se destina o texto enviado por algum autor para análise.
Sempre me pergunto o que um cara na minha idade pode querer com escrever.
Não tenho uma resposta precisa e definitiva para estas ou outras perguntas desse gênero. Alguém deve ler o que se escreve por aí, senão não haveria tantas livrarias, editoras, escritores e concursos literários.
Sou leitor, e como leitor tenho minhas preferências, sou um dos que formam algum tipo de perfil que as editoras tanto valorizam conhecer e para o qual publicam determinados livros, mas não sei bem qual é o meu perfil, leio obras de diversos estilos e naturezas. Ultimamente tenho lido muita coisa científica e poesia. Meu plano para o segundo semestre é reler a Ilíada e a Odisseia, quando não encontro nada que me interesse corro para elas. Por enquanto estou entretido com lançamento de livros e música.
Talvez este livro Antroplogia de Mim, que será lançado em junho, eu devesse ter lançado há uns 40 anos, não que os poemas ou as ideias nele contida tenham embolorado por o livro estar guardado numa gaveta desde aqueles tempos, esse livro foi todo escrito no segundo semestre do ano passado, mas naquela época eu escrevia poemas e um dia joguei tudo no lixo. Eu tinha uns 20 anos e escrevi uns textos e uns poemas, tinha um amigo que escrevia e publicou um livro que foi muito elogiado pela crítica da época e por Caetano Veloso, isso foi em 1974, eu disse a esse amigo que tinha escrito uns textos, ele leu e disse que tudo era uma merda, hoje acho que não eram merda, mas o cara tinha sido elogiado por Caetano Veloso, pensei devem ser mesmo uma merda. Esse cara nunca mais escreveu nada, hoje é professor universitário publicou uma tese sobre Canudos e mais nada. O livro dele realmente era muito bom.
Na década de 1990 escrevi vários romances, não consegui publicar nenhum, consegui publicar apenas o livro de contos Bodas De Ouro, Editora Argos, este sim tem uns contos que são uma merda. Perguntei a mim próprio: que editor vai ler um romance de trezentas páginas de um ilustre desconhecido? Isto ficou comprovado quando enviei quatro romances a uma editora que me respondeu dois dias depois do recebimento: 'os textos não se enquadram no nosso perfil editorial' , será que eles leram uma mil e trezentas páginas em um dia para chegarem a essa conclusão? Então: textos curtos, como, por exemplo, poemas. Mesmo os mais preguiçosos editores não vão deixar de ler uns poemas que resolvem em poucas linhas. Dito e feito, três editoras se interessaram pelos textos.
Agora preciso encontrar leitores.

10/05/2011

05 maio 2011

Estranhamento

Eu me sinto estranho e deslocado com a proposta deste site de me tornar escritor. Dá a impressão de que escrever é tarefa super-humana, ou para os 'escolhidos'. Escrevi uns livros e penso em dar continuidade a esse processo escrivinhatório. É como cantar - qualquer um canta-, ou mesmo - falar todo mundo fala-, mas daí a ser cantor ou orador tem de se percorrer uma estrada comprida e esburacada como as rodovias brasileiras sem pedágio. Dá para pagar o pedágio e daí a publicar um livro, a distância diminui consideravelmente. Porém deve ser sem graça, deixo este processo a quem tem mais vaidade do que eu, porque quero que o que escrevo tenha "valor literário" ( não sei bem o que é isso, mas me disseram que é assim ). Mesmo que eu achasse lícita esta maneira de ter um livro publicado, não teria grana suficiente para custear o tal pedágio.
O substantivo escritor parece que dá a condição de profissional ao sujeito que escreve, o escritor tem de ser intelectual, saber citar grandes autores é importante. Apesar de ler muito, minha memória sempre foi precária, por mais que tenha lido, os livros de que lembro com grande satisfação são os lidos na infância. Lembro de um em especial: Três Garotos em Férias no Rio Tietê de Francisco de Barros Júnior. Li diversas vezes as aventuras dos três garotos que partiram numa canoa de São Paulo com o tio e o cão perdigueiro. O contato com a selva me fascinava, a sucuri que pega o cão, as pescarias de dourados, surubins, tabaranas, os acampamentos ao logo do rio. Depois li do mesmo autor Três Escoteiros em Férias no Rio Paraná, mais aventuras no mato.
Já nasci farto de São Paulo. Nasci no bairro da Liberdade, na Travessa dos Aflitos, talvez por isso a cidade me causasse tanta aflição. Minha mãe dizia que o meu foi o primeiro ou segundo batizado da Catedral da Sé, que foi inaugurada em 25 de Janeiro de 1954, aniversário da cidade, dia do 4° centenário. Fui batizado em dezembro de 1953, a catedral não tinha nem as torres. Uma das maiores catedrais góticas do mundo, muito bonita, os vitrais são maravilhosos, porém as idéias que se propagam ali nunca me atraíram, pois li, estudei e descobri outros saberes mais interessantes. Mas eu dizia do meu fastio de São Paulo, eu era um rato de esgoto urbano descontente com a cidade. Nas férias escolares, minha família passava em Taquaritinga, na casa dos meus avós maternos, no quintal da casa deles eu fazia lavouras de milho, de abóbora e melancia, eu me sentava no pé da mangueira e ficava tempo sentindo o cheiro da terra e a umidade fria que brotava da terra. Fiz agronomia em Botucatu, no começo sofri com minhas idéias urbanas obsoletas e incabíveis numa cidade interiorana, depois entrei no ritmo da cidade, e sofri quando me formei e tive de ir embora. De vez em quando olho a foto da república Muquifo, que foi uma escola de vida para mim.
Exerci diversas atividades e nunca finquei o pé numa carreira, sempre quis conhecer tudo, alcançar tudo. Agora escritor. Vamos ver no que dá. Em junho sai meu quarto livro, Antropologia de Mim. Os poemas deste livro podem ser lidos na sala, como se fazia antigamente nos saraus, alguns contém um pouco de sacanagem, mas advirto a todos tudo que está ali é mentira. Sempre gostei de mentir, descobri que o bom escritor é sempre um grande mentiroso, grande mentiroso é aquele que mente e todos pensam que ele diz a verdade até sobre si próprio. Tudo que digo no livro é verdade, dito de maneira mentirosa. Nada é sobre mim, apenas uma colagem de diversos eus.

05/05/2011

02 maio 2011

Até os bons escritores morrem, mas quem se lembra deles

Pois é, morreu Ernesto Sabato, aos 99 anos. Considerado um dos três pilares da literatura argentina, os outros dois são Cortázar e Borges. Li apenas dois livros de Sabato, na década de 1970: O Túnel e Sobre Heróis e Tumbas. Gostei muito mais do primeiro, uma novela escrita em primeira pessoa, o segundo é um romance com personagens históricos da Argentina.
Cortázar lançava um ou mais livros anualmente, nos anos 1970, o que fez eu me ligar mais à literatura deste, e também por ser uma literatura de delírios, isto me atrai.
Sabato e Cortázar eram da mesma geração, falo de cronologia apenas, porque esse hábito de se comparar estilo de escritores tomando-se por base a "geração" a qual pertencem pode levar a um erro de análise. Para mim é apenas a mania fazer de padronizações simplistas que todos temos. Se isso fosse válido, bastaria ler uma obra de um escritor de uma determinada época e tudo estaria desvendado. Eu estaria excluído da literatura, já que comecei a escrever quando a maioria se aposenta, aí fica a pergunta: pertenço a qual geração? Se puder escolher sempre pertenço ao dia atual, porque mesmo sendo pior, o dia de hoje é melhor do que o de ontem, afinal é o dia que temos.
Outra coisa que me ligou a Cortázar foi a dedicatória que ele fez para o disco A Un Semejante de Susana Rinaldi, em 1976, Susana é para mim a melhor cantora de tangos.
Sábato formou-se em Física e era artista plástico, acho que devia ser um palpiteiro como eu: sou formado engenheiro agrônomo, já joguei futebol ( bom de bola ), fui professor de Física, Química e Matemática ( péssimo professor ), sou metido a violonista e violeiro ( inseguro ), além de escritor ( me safo ).
Não vou falar sobre Borges porque não tenho estatura intelectual para tanto, li suas Obras Completas e em cada conto há um universo fantástico. Acho interessante o fato de ele ser considerado o maior escritor argentino e nunca ter escrito um romance ou novela, somente textos curtos.
Susana teve de se exilar em Paris, na época da ditadura militar na Argentina, Cortázar já vivia lá. Cortázar participava da Comissão Bertrand Russell, instalada em Roma, para apurar os crimes da ditadura argentina. Ernesto Sabato escreveu Nunca Mais que denunciava os crimes da ditadura e foi o estopim para apuração desses crimes.
Escritores nunca foram bem vistos em época alguma, poetas menos ainda, entretanto o livro de Sabato, Nunca Mais, lançado em 1980, foi a enzima catalisadora do fim da ditadura.
Tudo isto para dizer que escritor é azarado até quando morre, ninguém fala da morte de Sabato, deu azar de morrer um dia antes do Bin Laden. Sobre esse azar de escritor escrevi um artigo que foi publicado no jornal A Notícia de Joinville, quando morreu o poeta Mario Quintana, pois ele deu o azar de morrer na semana em que morreu Ayrton Senna. Ninguém ficou sabendo que ele morrera, talvez nem tenha morrido, talvez esteja por aí, passeando pelo centro de Porto Alegre, talvez tenha se transformado no passarinho que ele tanto quis ser.

02/05/2011

01 maio 2011

O carrasco da Editora Multifoco

Virei blog.
Eu não queria por preguiça, pois é mais um compromisso dentre os tantos que não tenho. Porém o editor me obrigou. O nome do carrasco é Frodo Oliveira, a editora se chama Multifoco. Obedeço porque não é sempre que aparece alguém que decide publicar o que escrevo. O último que me deu essa oportunidade se chama Valdir Prigol, da Editora Argos da Universidade de Chapecó/SC, que há 10 anos publicou o livro de contos Bodas de Ouro, esta editora atualmente publica apenas livros técnicos e teses da própria universidade. Talvez o fato de não ter vendido nenhum exemplar de Bodas de Ouro tenha contribuído para essa decisão.
Frodo me disse que não posso ser 'escritor ermitão'. Ele não sabe, mas me senti bem sendo comparado a um ermitão, ermitão mesmo, aquele que mora em caverna. Até porque já vivi dessa forma por alguns meses, na Praia do Cachadaço em Parati/RJ, Passei um verão inteiro numa caverna que há no morro no final da praia, talvez essa caverna nem mais exista, faz muito tempo, não sei se a especulação imobiliária chegou a essa praia. Lembro que tomava banho numa bica, quando voltei a São Paulo tive a sensação de que era pela primeira vez que chegava a uma cidade.
A Editora Multifoco vai publicar um livro de poemas de minha autoria que se chama Antroplogia de Mim, preciso sair da caverna para divulgá-lo. Ele me disse "divulgue aos parentes, amigos, conhecidos". Conheço pessoas e pessoas, talvez a maioria fique chocada com o que escrevo e talvez isso atrapalhe o relacionamento que mantemos em outras áreas.
Mas escrevi poemas que chocam ou pelo menos com a intenção de chocar? Alguns sim outros não. Os sim são meras constatações sobre o funcionamento geral das pessoas e isso pode ser um choque, não de alta amperagem que mata, mas de alta voltagem que derruba e o indivíduo pode se machucar devido ao tombo. Porém minha intenção não é ferir, mas somente causar um pruridozinho no cérebro do vivente que ler o livro. Antropologia de Mim tem alguns poemas que são somente um exercício de lógica a apontar algumas contradições da alma humana. As contradições eu busco dentro de mim próprio, sem muito esforço: sou um poço cheio delas, é fácil.
Vamos ao trabalho, então.

PS: se o Frodo soubesse que aqui em casa temos fogão a lenha para cozinhar e aquecer o ambiente, teria certeza de que sou muito mais ermitão do que imagina.

José Otavio Carlomagno

1° de maio de 2011 - coincidentemente Dia do Trabalho.